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“Love, Death and Robots”, 2º Temporada: animações perturbadoras sobre um futuro preocupante

O medo é um poderoso tema para a arte

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Com uma segunda temporada mais curta do que a primeira, os oito episódios de “Love, Death and Robots” convidam novamente o espectador a refletir sobre distopias diabólicas sem perder o bom humor e uma avalanche de situações insólitas. Ter oito em vez de dezoito episódios evita o inchaço e, por isso, podemos assistir um seguido do outro e refletir o conjunto da obra com mais facilidade, ainda que cada episódio encerre em si mesmo.

O medo é um poderoso tema para a arte. São diversas as produções cênicas que exploram uma espécie de Espírito de Época, traduzindo as fobias coletivas. Porém, diferentemente de obras como “Tubarão”, que explora o medo d’água, ou “Independence Day”, o medo do desconhecido, “Love, Death and Robots” questiona quais serão os medos coletivos de um futuro próximo, caso a humanidade continue trilhando o caminho que está seguindo nos dias de hoje. Dois episódios dessa segunda temporada exploram o medo de uma revolução tecnológica: “Atendimento Automático ao Cliente” e “Gaiola de Sobrevivência”. O primeiro, baseado em uma história de John Scalzi, tem seu humor apesar da angústia de seus personagens bastante idosos enfrentando o ímpeto assassino de um aspirador de pó inteligente. O segundo, com esse mesmo tema, baseado no conto de Harlan Ellison, tem Michael B. Jordan numa versão animada impressionante. Ele é um combatente tendo que lutar pela sua vida após sua nave ser abatida e ainda ter que enfrentar um droide de manutenção que enlouqueceu dentro de uma espécie de base militar numa lua distante.

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Os dois episódios citados acima mostram como um mesmo tema pode ser abordado de forma completamente diferente. Enquanto rimos da luta entre uma senhora de idade avançada contra um robô psicopata, urramos de dor ao ver outro robô assassino esmagando os dedos do combatente cosmonauta. E nenhum desses episódios abordam algo novo, mas um dos pontos fortes dessa série é justamente a sua capacidade de nos mostrar histórias com temas semelhantes, porém com diferentes tons, texturas e até mesmo ritmo de animação.

Nem todos os episódios abordam diretamente o medo. “O Gigante Afogado”, o último episódio dessa temporada, é mórbido, é existencialista, mas extremamente tedioso. Sem muita ação, acompanhamos uma espécie de um diário de um cientista estudando um imenso corpo de um gigante falecido e nu que encalhou na areia da praia feito uma baleia. Ao mesmo tempo que o objeto de pesquisa lhe causa interesse e paixão, não deixa de ser também objeto de análise a relação que a população daquela cidade estabelece com a estranha novidade que veio dar na praia. Mas é um episódio distante, impessoal demais, pouco criativo e com provocações tímidas se comparadas com as dos demais episódios dessa temporada.

O episódio “A Grama Alta” só não é mais tedioso que “O Gigante Afogado” porque temos um pouco de ação. O problema é que vai ganhando ritmo somente da metade para o final. E por falar em final, que desfecho anticlimático! Mas é uma das mais belas direções de arte dentro dos episódios desta temporada, quase um quadro expressionista a cada frame. Na história, um trem simplesmente para em meio ao nada. Dá para ver somente o trilho, o trem, o céu e uma alta vegetação cobrindo completamente a paisagem até o horizonte. Um passageiro desce para fumar e é alertado pelo condutor para que volte tão depressa possível para dentro, pois é só o tempo de aquecer novamente as caldeiras da locomotiva e o trem partirá com ou sem ele. Estupidamente, o passageiro resolve investigar uma estranha movimentação em meio àquela vegetação. Para não dar spoiler, vamos apenas dizer que as coisas demoram para acontecer e, quando acontecem, nos faz dar aquele pulo de susto, mas nada além disso. O final é apressado, descontextualizado, tentando explicar algo que seria melhor simplesmente deixar para que o espectador tirasse sua conclusão.

Por algum motivo que não consigo explicar, o episódio “Gelo” é um dos mais elogiados pela crítica. Talvez porque aborda a inconsequência típica da juventude, mesmo que em um mundo onde os seres humanos são todos, exceto um, melhorados geneticamente. Ou talvez pelo bom trabalho artístico que permite imersão em belos cenários e expressões faciais bastante críveis. Porém, a história em si é simples, quase tola. Seu final é bastante previsível e pouco se tira para maiores reflexões após a exibição.

Os melhores episódios são, nessa ordem: “Snow no Deserto”, “Pela Casa” e “Esquadrão de Extermínio”. Valem a temporada e são os mais provocantes, dignos dos melhores episódios de séries como “Black Mirror” e “Além da Imaginação”.

O episódio “Pela Casa” é o mais curto, entretanto o mais apavorante. Daqueles que, depois de assistí-lo, você dá um tempo, vai tomar uma água e reza para que tenha uma boa noite de sono sem pesadelar com o que viu. Uma história natalina, com crianças esperando o Papai Noel e bastante distoante dos demais episódios, por não falar de morte, nem tecnologia e nem robôs. Apenas um grotesco stop motion e a alegria de crianças que percebem que o velho Noel está em sua casa e que seus presentes já estão à caminho. Para não dar spoiler, apenas digo uma coisa: o que teria acontecido caso aquelas crianças não fossem boas?

“Snow no Deserto” poderia ser tranquilamente um longa metragem. De certa forma, fala sobre imortalidade, mas é um dos episódios mais completos em termos de narrativa. Tem ação, romance, aventura, ficção científica, suspense e até um pouco de humor. Um homem possui em sua genética uma capacidade rara de regeneração que lhe proporciona tamanha longevidade que podemos vê-lo como um imortal. Mas seus dias se dão em um cenário apocalíptico, daqueles de “Mad Max”. Mercenários de todos os tipos e espécie estão atrás dele, quando, em meio a fugas espetaculares, conhece uma mulher misteriosa. Os dois vão estabelecendo uma relação improvável, instável, adversa, mas cheia de sentimentos. À medida que um vai desvendando o outro, cresce a admiração, mas sobrevêm sempre os perigos.

Por fim, “Esquadrão de Extermínio” é o maior episódio e também o melhor de todos desta temporada. Também aborda o tema da imortalidade, porém em uma profunda relação de luta de classes projetada para o futuro. Quando a imortalidade é conquistada pela humanidade, para que se nasça um novo ser humano, é necessário exterminar outro. Assim, temos uma nova composição de classes sociais: os imortais, que vivem acima das nuvens, e os que optam em ter filhos, segregados ao nível do solo. Digno de “Blade Runner”, o episódio nos toca ao falar de paternidade ao mesmo tempo em que testa teorias malthusianas. Há inúmeros outros temas que podemos extrair deste episódio, mas nos impacta a imensidão de emoções do protagonista: um policial, membro do esquadrão de extermínio infanticida, dividido entre o dever e o senso de humanidade. O final é de escorrer uma lágrima pelo rosto.

VEREDITO: “Love, Death and Robots” acerta ao encurtar o número de episódios e nos oferece em pelo menos metade deles ótimas experiências. Todas as animações são muito bem feitas, mas metade delas possuem histórias bastante rasas e até mesmo esquecíveis. Ainda bem que as quatro melhores histórias são tão boas que valem a pena a atração e nos deixa pensando por dias sobre o mundo de coisas que vimos. NOTA: 8,5.

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