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É #FAKE que relatórios do governo do Reino Unido sugerem que vacinados contra Covid têm desenvolvido Aids

Governo britânico e especialistas desmentem publicação falsa que tem circulado nas redes sociais. Boato foi compartilhado pelo presidente Jair Bolsonaro em live.

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É #FAKE que relatórios do governo do Reino Unido sugerem que os vacinados contra Covid estão desenvolvendo Aids — | Foto: Reprodução |
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Circula pelas redes sociais uma mensagem que diz que relatórios oficiais do governo do Reino Unido sugerem que as pessoas totalmente imunizadas contra a Covid-19 têm desenvolvido a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Aids). É #FAKE.

A mensagem falsa diz: “Uma comparação de relatórios oficiais do governo sugere que os totalmente vacinados estão desenvolvendo a Síndrome de Imunodeficiência Adquirida muito mais rápido do que o previsto”. Ela foi colocada no site conspiracionista beforeitnews.com, que publica textos dizendo que as vacinas rastreiam os vacinados e que milhões de pessoas morreram com as vacinas. A publicação foi mencionada pelo presidente Jair Bolsonaro em sua live semanal.

Ótica da Visão
 — Foto: G1
— Foto: G1

O Departamento de Saúde e Assistência Social do Reino Unido afirma que a publicação é de um site que propaga ‘fake news’ e teorias da conspiração e diz que a história não é verdadeira. Zahraa Vindhani, oficial de comunicações da Agência de Segurança de Saúde do Reino Unido, também afirma que “as vacinas contra a Covid-19 não causam Aids”. “A Aids é causada pelo HIV.”

Pesquisadores refutam as ideias contidas na publicação falsa.

Mestre em imunologia pela USP, doutora em biociências e fisiopatologia pela Universidade Estadual de Maringá e professora titular na Universidade Paulista, Letícia Sarturi aponta inconsistências no texto viral.

Uma delas diz respeito aos dados. “O artigo fala de uma possível redução de imunidade e degradação do sistema imune, que é por uma possível deficiência, mas ele não fala em nenhum momento como se chegou àqueles resultados. Em nenhum momento você tem como foi medida a porcentagem da imunidade. Porque a gente não mede a porcentagem da imunidade. Na imunologia, a gente pode medir o título de anticorpos, ou seja, quantos anticorpos estão sendo produzidos. Você pode medir a resposta imunocelular pela quantidade de células TCD8 e TCD4 que são direcionadas contra os vírus. Você consegue medir isso, fazer contagem de quantas células tem, você consegue titular o nível de anticorpos que o paciente tem. Então, você consegue fazer esse tipo de coisa em uma pesquisa. Mas você não consegue dar uma porcentagem de imunidade, porque imunidade é uma coisa muito subjetiva. Então, você não tem como falar: ‘Essa pessoa tem tantos por cento de imunidade’. Você pode aferir alguns parâmetros do sistema imune, você pode aferir a imunidade celular pela quantidade de células que respondem. Você pode aferir a imunidade humoral pelo nível de anticorpos que há ali no organismo, mas não tem como calcular o percentual de imunidade. Isso é bem absurdo. O texto não fala em nenhum momento como isso foi calculado, qual a metodologia que foi usada para chegar a uma porcentagem. Ainda mais essa perda semanal de imunidade, isso é bem estranho”, diz. É um primeiro indício da falsidade da mensagem.

O autor da mensagem falsa insiste na tese de que a queda da eficácia da vacina se deve a uma queda da imunidade porque o seu sistema imune está se deteriorando pelas vacinas. “Não faz nenhum sentido”, diz Sarturi. Ela explica: “Primeiro porque a queda da imunidade com o decorrer do tempo é natural. Isso vai acontecer, não só para vacina de Covid, mas para qualquer vacina, para qualquer tipo de imunidade contra infecção. Com o decorrer do tempo, a imunidade vai ser menor, vai diminuindo. As vacinas contra a Covid provocam a imunidade e a gente tem visto que os níveis de anticorpos começam a se reduzir geralmente pelo sexto mês, ou sétimo, depende muito da vacina. Porém, as células que respondem, as células de memória, elas continuam ali presentes. Então, isso é um fato importante, porque isso ainda continua garantindo uma certa proteção, uma certa imunidade, por um tempo. A gente está entrando, por exemplo, na terceira dose para idosos porque essa redução no nível de anticorpos pode comprometer, sim, a imunização dos idosos. Isso é natural. É natural que a imunidade se ative, que forme células de memória e, com o decorrer do tempo, fatores solúveis como os anticorpos, que estão diluídos no sangue, diminuam, se depurem. Então a gente espera, sim, que com o decorrer do tempo a pessoa tenha uma redução nesses fatores associados à imunidade. Porém, falar que você está perdendo, deteriorando seu sistema imune sem nenhuma prova… Ali [no texto] não se prova nada, tem porcentagens colocadas em uma tabela e não tem nenhum experimento, não tem nenhum gráfico experimental usando algum tipo de metodologia, não tem nenhum tipo de aprovação de comitê de ética ou qualquer tipo de desenho, delineamento do experimento para a gente ver como é que foi conduzido isso para se chegar, de fato, a esses dados. Parecem uns cálculos retirados aleatoriamente. Me parece uma coisa muito de opinião, muito subjetivo”. Isso porque, de fato, tal estudo jamais foi feito.

A pesquisadora classifica como absurda outra ideia contida na publicação. “O autor do texto fala que essa queda da imunidade se deve a uma deterioração do sistema imune porque os pacientes que estão sendo vacinados estão tendo imunodeficiência e isso é absurdo”, diz. Ela explica que existem vários tipos de imunodeficiência. “Temos imunodeficiências que são primárias, em que o paciente já nasce com imunodeficiência, mas a gente também tem as secundárias, que são causadas, por exemplo, pelo HIV ou por conta de doenças autoimunes, doenças parasitárias, desnutrição. Você pode ter ali quadros de imunodeficiência secundários. Só que a imunodeficiência não faz sentido nenhum ser desenvolvida por conta da vacina. É o contrário. A vacina estimula o seu sistema imune à produção de resposta imune. Ela não vai gerar nenhum tipo de imunodeficiência”, diz.

Por fim, ela ataca a parte do texto que relaciona as vacinas com o fenômeno de ADE (Antibody-dependent enhancement). A tese dos ADEs é rotineiramente veiculada pelos opositores às vacinas e já foi desmentida pelo Fato ou Fake.

“Eles insistem na tese do ADE. É outra coisa que não faz sentido. Primeiro porque não foi provado que tem ADE para quem é vacinado contra a Covid-19. No ADE, você tem uma resposta exacerbada no encontro com o vírus e essa resposta exacerbada aumenta a inflamação, provoca uma inflamação forte que prejudica o organismo. Mas ADE não ocorre pelas vacinas de Covid-19. Não há prova disso. Isso tem sido pesquisado, muita gente já foi vacinada e nenhuma manifestou ADE. As vacinas de Covid não provocam ADE. ADE não é causador de imunodeficiência e não tem acontecido com as pessoas vacinadas.”

Mateus Falco, biomédico, mestre em microbiologia pela Universidade Estadual de Londrina (UEL) e divulgador científico pela Rede Análise Covid-19, afirma que a publicação faz uma confusão sobre a eficácia da vacinação.

“A proteção da eficácia na vacinação não é uma medida individual. Se você recebe as duas doses, você não está duplamente mais protegido do que as pessoas que não tomaram nenhuma. A eficácia da vacinação não leva em conta a resposta imunológica individual. Na eficácia da vacinação são comparados dois grupos, um que recebe a vacina e outro que não recebe. Então é avaliado um desfecho, pode ser risco de morte ou internação. Nesses casos, temos o cálculo do risco de um grupo em relação ao outro e podemos falar em 50% em eficácia na vacinação”, diz.

Falco aponta que outra confusão relacionada à diminuição da eficácia da vacina ocorre quando são comparadas as semanas de acompanhamento do relatório. “No estudo clínico, você tem uma quantidade definida de voluntários e faz o acompanhamento até o resultado. Esses relatórios divulgam os eventos no mundo real de acordo com as semanas, e não estão relacionados com o mesmo grupo de pacientes. Quando se lê a ‘notícia’, a impressão que temos é que as pessoas estão com o sistema imunológico baixando com o tempo, mas isso não foi analisado nesses relatórios semanais. Tanto que no relatório da semana 36 existem várias tabelas mostrando os resultados da Pfizer e Oxford-AstraZeneca sobre a eficácia da vacinação tanto para as variantes Alfa quanto Delta com valores acima de 80% após a 2ª dose das vacinas.”

Falco destaca, por fim, que a publicação faz uma afirmação mentirosa de que a vacinação degrada o sistema imunológico, levando à síndrome da imunodeficiência adquirida. “Isso não é verdade. A função da vacina é estimular o sistema imunológico para agir contra o vírus Sars-CoV-2, e não interromper a ação do sistema imunológico. A ação da vacina é muito diferente, por exemplo, de um medicamento imunossupressor. Esse, sim, vai diminuir a resposta imunológica. Eles são usados para pacientes com doenças autoimunes. A hidroxicloroquina, inclusive, é um medicamento indicado para o tratamento dessas doenças.”

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