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Brasileiro é aceito em Harvard com projeto sobre influência de povos negros no design

Gustavo Borges cursou ensino público, foi bolsista na faculdade e agora faz “vaquinha” virtual para cursar pós-graduação em Harvard

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Gustavo mostra comunicado sobre aprovação para pós-graduação em Harvard — Foto: Gustavo Borges
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Foi com 16 anos que o adolescente Gustavo Borges, de Santa Bárbara d’Oeste (SP), teve o primeiro contato com o termo Ivy League, que faz referência às oito universidades mais prestigiadas dos Estados Unidos. Mesmo não falando inglês, o jovem ficou fascinado com a ideia de ir estudar em uma dessas instituições, principalmente Harvard, a mais antiga da Ivy League, fundada em 1636, e também aquela que é considerada a melhor do mundo em diferentes avaliações.

Hoje, com 31 anos e formado em design gráfico, Gustavo vê a possibilidade de realizar esse sonho muito mais próxima. Isso porque, no último dia 6 de março, ele recebeu a comunicação de que foi aceito em Harvard para cursar uma pós-graduação em sua área.

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Para conquistar uma das tão concorridas vagas, destinadas a apenas 4% dos que tentam, o morador do interior de São Paulo propôs uma pesquisa que resgate a influência dos povos africanos e negros brasileiros no design.

“A ênfase da minha pesquisa, que é transdisciplinar, se dá em um problema sócio-político brasileiro. Eu vou analisar a visão eurocêntrica e distópica sobre a história do design no nosso país, buscando resgatar as contribuições dos povos africanos e negros brasileiros que foram apagadas intencionalmente por colonizadores e apoiadores da escravização desse grupo de pessoas”, explica.

Gustavo explica que no Brasil já há estudos sobre o tema mas que sua ideia é, justamente, além de ser autor, realizar uma pesquisa colaborativa. “Tenho um desejo muito grande de contatar esses pesquisadores que já fizeram algum estudo em relação a isso e ‘levar eles’ comigo para Harvard. Porque eu faço essa organização desse conjunto de material que eu vou achar, que basicamente vai ser focado de 1530 até 1970, e aí eu vou criar essa linha da história do Brasil focada nesse apagamento que foi imposto a povos africanos e negros brasileiros”, revela.

A fase seguinte seria trazer o material ao Brasil em formatos mais populares e acessíveis, como vídeos para redes sociais e podcasts.

“[O objetivo é] usar a teoria do design como uma ferramenta para quebrar o voto de silêncio do genocídio criminoso e sádico cometido contra essa comunidade, e buscando continuar com uma das ideias do Abdias Nascimento – intelectual brasileiro e ativista pan-africanista – de modelar a civilização do futuro, livre de exploradores e explorados, em busca da impossibilidade de opressores e oprimidos de qualquer raça ou cor epidérmica”, detalha.

Universidade de Harvard, nos Estados Unidos. — Foto: Harvard University/Divulgação
Universidade de Harvard, nos Estados Unidos. — Foto: Harvard University/Divulgação

Escolas públicas e bolsa na faculdade

Para chegar até o comunicado de 6 de março, Gustavo aproveitou todas as oportunidades educacionais que sugiram em sua trajetória. Sua educação infantil, ensino fundamental, médio e técnico foram inteiros dentro de escolas públicas. E o verdadeiro divisor de águas foi o curso de comunicação visual que realizou na Escola Técnica Estadual (Etec) Polivalente, em Americana (SP).

“O técnico na Etec foi particularmente transformador na minha vida. Foi o curso que me ajudou a descobrir minha profissão atual. Na época, eu terminei o curso já estagiando, e também viajei para o exterior pela primeira vez por ter sido escolhido como um dos melhores alunos da escola, ganhando uma bolsa de um mês de ensino de língua inglesa em Berkeley, Califórnia”, conta.

O ensino privado veio apenas na faculdade, no curso de design gráfico. Mas nos quatro anos de graduação, três deles foi bolsista do Programa Escola da Família, trabalhando para o governo nos finais de semanas dentro de escolas públicas em comunidades mais vulneráveis. “Eu atuava como estagiário no auxílio de atividades que envolviam educação, esporte, cultura e saúde. Em contrapartida, o governo arcava com o custo da mensalidade do curso”, conta.

Durante a trajetória acadêmica, Gustavo também descobriu uma fundação que ajuda brasileiros a se preparem para diversas faculdades nos Estados Unidos, mas não conseguiu entrar no processo seletivo porque o edital aberto atendia jovens de até 14 anos.

“Apesar da frustração, o sonho continuou comigo, e nunca parei de pesquisar sobre a possibilidade de conseguir estudar fora. Quinze anos depois da minha descoberta das Ivy League, Harvard voltou ao radar por possuir um curso dentro da minha área de atuação, e que ia de encontro com o tema da pesquisa que queria realizar”, relata.

Movimento tranquilo na Etec Polivalente, em Americana (SP), onde estudou Gustavo — Foto: Fernando Jacomini
Movimento tranquilo na Etec Polivalente, em Americana (SP), onde estudou Gustavo — Foto: Fernando Jacomini

‘Vaquinha’ virtual e mais duas alternativas

Mas para o sonho de fato ser concretizado a barreira é financeira. Gustavo precisa de R$ 1 milhão para conseguir manter o curso e a estadia no país norte-americano.

“Mesmo que meus pais vendam a casa e carro e que a gente junte todas economias que temos, ainda assim não teríamos dinheiro pra bancar o curso e moradia dos dois anos […] E mesmo que eu trabalhe lá, eu poderia trabalhar apenas 20 horas por semana com o visto concedido. O consulado exige ter em conta o valor todo do primeiro ano [R$ 500 mil]”.

O designer já tem três alternativas para buscar os recursos. A primeira seria encontrar instituições ou pessoas que ajudem brasileiros aprovados em universidades nos Estados Unidos a cobrir seus gastos com os anos letivos, sejam instituições focadas nisso, pessoas ou empresas que façam doações ou trabalham com filantropia.

“Como segunda opção, estou participando de duas bolsas diretamente com a Harvard, que podem me fornecerem ajuda financeira”, explica.

Mas, como não sabe se vai conseguir as bolsas aplicadas ou o valor que vai receber dessas bolsas, ou se vai achar alguma instituição que o ajude, Gustavo decidiu pensar numa terceira opção, que é a de abrir uma “vaquinha” online como um modo paliativo, onde qualquer pessoa pode o ajudar com a quantia que queira.

A vaquinha está hospedada no site da Benfeitoria com o título “Você pode me ajudar a estudar em Harvard” e, até as 16h deste sábado (25), contava com R$ 14,8 mil em doações. A meta dessa campanha é alcançar R$ 500 mil, metade do valor total, até abril. Gustavo demonstra esperança no objetivo e diz se apoiar no poder transformador da educação.

“Tudo que tenho hoje é devido ao acesso que a educação me trouxe. Saber da onde vim, e todos os desafios que meus pais passaram, e hoje ter em mãos uma aprovação de uma das melhores faculdades do mundo, é motivo de muito orgulho. É também um ato afirmativo. Todo mundo deveria ter o incentivo de correr atrás dos seus sonhos, independente do seu contexto econômico ou da sua origem”.

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