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Velório com barril de chopp e cremação com pipoca viralizam na internet; psicóloga explica sobre formas de lidar com luto

Mansur Miguel Mitne foi velado ao som de samba, em Londrina. Família de Bertile Leal Ferreira jogou buquê durante a despedida, em Curitiba. Familiares relataram dor da perda, mas disseram que homenagens tornaram o momento mais leve

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| Foto: Arquivo pessoal|
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Um velório com chopp à vontade, em Londrina, no norte do Paraná, e uma cremação junto com milho de pipoca, em Curitiba, viralizaram na internet pelo jeito diferente das despedidas.

Sempre animado e amante do samba, Mansur Miguel Mitne, de 73 anos, foi carregado no caixão ao som de Gonzaguinha, na terça-feira (9). Enquanto isso, amigos e familiares cantavam e brindavam em homenagem ao médico, no interior do estado. 

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Na capital, a família de Bertile Leal Ferreira, de 65 anos, chegou a jogar um buquê durante o velório, na segunda-feira (8). A brincadeira com as flores e a pipoca foram pedidos pela aposentada, antes de morrer. 

O objetivo dela era dar momentos de alegria, como fez durante a vida, àqueles que a amam tanto.

De acordo com os familiares, todos estão sentindo a dor da perda. Contudo, os pedidos atendidos se transformaram em homenagens e deixaram o momento da despedida mais leve.

Para a psicóloga Michele Monique Maba, que trabalha com luto em processos grupais e individuais, esse período pode ser enfrentado de diferentes formas. 

“É impossível viver um luto sem que haja um mínimo de choque, de angústia pelo desapego de não ter mais quem a gente ama por perto. O que a gente consegue é dar um outro tom, muitas vezes, para esse luto.”

‘Verdadeira guerreira’

Bertile poderia ter vários motivos para demonstrar desanimo ou reclamar de algum tratamento médico invasivo, mas isso não acontecia. Segundo a família, ela fazia o contrário.

Mesmo depois de enfrentar três cânceres, apresentar problemas em quase todos os órgãos do corpo e passar grande parte do tempo no hospital, a aposentada demostrava força e tirava um sorriso de todos.

“Ela era uma pessoa muito bem humorada, apesar de tudo que ela passou. Ela não queria que a gente sentisse pena dela. Nunca falou sobre tristeza, nunca reclamou de nada, de ir para o hospital. Ela sempre ia e voltava do hospital, mas infelizmente dessa vez não teve como, ela descansou”, disse a sobrinha Ariadne Leal.

De acordo com a sobrinha, Bertile morreu por causa de um derrame cerebral. Mas antes de partir, ela fez três pedidos.

O primeiro foi que a família jogasse um buquê durante o velório, para brincar que quem pegasse as flores seria o próximo a morrer e a se encontrar com ela.

Já o segundo foi o de colocar milho junto com o corpo ela, para que no momento da cremação estourasse pipoca.

Depois de atenderem esses pedidos, a sobrinha Ariadne contou o que fez em uma publicação na rede social. O vídeo viralizou e está com mais de 5,1 milhões de visualizações.

“Eu postei para mostrar quem era a minha tia, mas jamais achei que ia viralizar tanto. A gente ficou tão feliz. Muita gente falou que queria ter conhecido, que era uma pessoa sensacional, que queria entrar para a família. Foi uma forma da gente se sentir mais confortável. Ela está muito feliz também porque sempre gostou de brincar, então acho que ela está muito feliz com os outros falando tão bem dela”, contou.

Conforme a família, o último pedido de Beti, como era conhecida, ainda será realizado. Eles jogarão as cinzas dela do alto de uma montanha e na praia.

“Uma verdadeira guerreira, pelo fato de nunca ter reclamado. Às vezes a gente reclama mais da vida do quem realmente sofre. A gente aprendeu muito com ela a dar valor às pequenas coisas”, disse a sobrinha.

‘Uma pessoa muito feliz’

Quem conheceu o doutor Mansur sabe o quanto ele gostava de uma boa festa. Sempre de bem com a vida, o médico não queria choro no dia do velório.

Por isso, os filhos Valéria e Gustavo Rezende Mitne decidiram fazer uma festa em homenagem ao pai para o momento da despedida.

Junto de amigos e familiares, beberam mais de 1 mil litros de chopp e espumantes para comemorar a vida de quem se foi.

“Ele falou que gostaria que encomendasse os salgadinhos que ele gostava, era para ter samba, que ele queria cerveja”, contou Valéria.

Mansur faleceu após ter complicações por causa de uma leucemia, que descobriu em setembro de 2021.

Segundo os filhos, até nos últimos momentos, antes de ser intubado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), ele estava cuidando dos dois e preocupado com a tristeza deles.

“Meu pai era uma pessoa muito feliz. Tinha pacientes que iam consultar com ele sem estar doente, a gente percebia que iam para conversar. Meu pai era uma pessoa que colocava qualquer um para cima, a gente brinca que ele colocava até pessoas em velório para cima. Realmente é a personalidade dele”, disse Gustavo.

Durante o velório, alguns amigos publicaram vídeos da homenagem prestada. As imagens começaram a ser compartilhadas na internet e o caso ganhou destaque nas redes.

Conforme Gustavo, eles não esperavam tantos desdobramentos com o velório, pois o da mãe deles, em 2019, tinha sido parecido e não houve essa repercussão.

Depois do ocorrido, muitas pessoas conversaram com os filhos e disseram que querem fazer o mesmo durante o velório dos entes queridos, para tentar amenizar a dor de um dia tão difícil.

“Se a gente acredita que aqui não é o ponto final, a maioria das religiões pregam isso, por que não comemorar? A maioria prega que a vida que vem depois é melhor, então por que não fazer disso uma festa? É obvio que a saudade dói, a saudade vai ficar cada vez maior e mais doída, ainda mais do pai que a gente tem, ele é o melhor pai do mundo com toda certeza, mas foi uma forma mais leve de se ter essa passagem”, explicou o filho.

A dor do luto

De acordo com a psicóloga Michele, a forma de lidar com o luto pode mudar muito dependendo da cultura das pessoas.

“Nós, como latinos, temos muito a questão de entrar em contato com a dor, de velar, enterrar ou cremar em muito pouco tempo, em elaborar aquela dor de cara. Em outras culturas a gente acaba adiando um pouco esse sofrimento e vai lidando aos pouquinhos.”

A religião também é um dos fatores que podem influenciar nesse período.

Dependendo no que a família acredita, a forma de ter esperança no pós-morte pode ajudar a encarar o processo de perda com mais facilidade, segundo Michele.

Independentemente de como o momento de luto é enfrentado, respeitar o modo de cada um é essencial nesse momento tão delicado.

A especialista ainda recomenda quem está nesse processo busque ajuda profissional, principalmente, por meio de grupos de luto, pois é um lugar que existe uma troca de experiência enriquecedora e que pode ajudar a entender melhor o que pode ser feito depois de perder alguém.

“O grupo tem uma importância fundamental, deliciosa, para que as pessoas compartilhem as suas angustias, percebam que não estão sozinhas e modelem essa esperança que há dias melhores, mesmo diante de tamanha dor.”

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