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Economia

Recordista em desigualdade, Brasil estuda alternativas para ajudar os mais pobres

O Brasil é mais desigual que Botsuana, com 0,533 pelo índice de Gini, pequeno país vizinho a África do Sul com pouco mais que dois milhões de habitantes

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|Foto: Tânia Rego/Agência Brasil|
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A pandemia escancarou, mais uma vez, o péssimo quadro da desigualdade social e econômica no Brasil. Durante a primeira onda do coronavírus, no ano passado, mais de 30% dos 211,8 milhões de residentes nos 5.570 municípios brasileiros tiveram de ser socorridos na etapa inicial do auxílio de R$ 600 aprovado pelo Congresso, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgados em julho de 2020.

O contingente dos que precisaram de ajuda espantou até mesmo algumas áreas de governo, mesmo tomando em consideração os desvios e irregularidades cadastrais. O Tribunal de Contas da União (TCU) estimou no relatório divulgado ao final de fevereiro que 7,3 milhões de brasileiros podem ter recebido o auxílio emergencial indevidamente. Mesmo quem não agiu de forma intencional, terá que se acertar com o Fisco agora em 2021.

Ótica da Visão

Os cálculos variam entre 67 e 68 milhões de brasileiros na primeira fase e cerca de 57 milhões na segunda rodada, a partir de setembro quando o auxílio foi reduzido para R$ 300. Essa variação do número de beneficiários depende da fonte de informação consultada.

Além do espantoso número de beneficiários, o custo do chamado coronavoucher evidenciou o peso financeiro da desigualdade no país. Foram gastos praticamente R$ 293 bilhões no ano passado, cerca de 56% dos recursos federais desembolsados para enfrentar a primeira onda da pandemia, de acordo com o Siga Brasil, sistema do Senado que facilita a busca de dados do Tesouro Nacional. Ou R$ 321,8 bilhões, conforme os cálculos divulgados pelo Ministério da Economia sobre o gasto com o auxílio emergencial.

O importante é que qualquer uma das duas cifras reflete o custo elevado do perfil de distribuição de renda no país. Os recursos socorreram não só os que ficaram desempregados ou perderam seus pequenos negócios no meio da maior crise sanitária deste século. Entre os elegíveis ao benefício estavam brasileiros situados na base da pirâmide social. Ou seja, os pobres que vivem com menos de US$ 5,50 por dia ou os muito pobres que conseguem apenas US$ 1,90, conforme classificação do Banco Mundial. 

Desigualdade

— O Brasil está entre os dez países mais desiguais do mundo — afirma o sociólogo Luis Henrique Paiva, coordenador de estudos em seguridade social do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

De fato. A publicação Síntese de Indicadores Sociais, divulgada pelo IBGE em 2020, trouxe estimativas do Banco Mundial com base no índice de Gini, instrumento criado pelo matemático italiano Conrado Gini para medir o grau de concentração de renda no grupo a ser avaliado. A variação numérica é de zero a um, sendo zero quando todos têm a mesma renda e um representando o extremo oposto.

Nesse ranking da desigualdade, o Brasil apresenta 0,539 pelo índice de Gini, com base em dados de 2018. Está enquadrado entre os dez países mais desiguais do mundo, sendo o único latino-americano na lista onde figuram os africanos. O Brasil é mais desigual que Botsuana, com 0,533 pelo índice de Gini, pequeno país vizinho a África do Sul com pouco mais que dois milhões de habitantes.

Visto do topo da pirâmide social, o Brasil é um dos recordistas em concentração de renda no mundo. Relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) divulgado no final de 2019, portanto antes da pandemia, mostrou que o 1% da população mais rica detinha 28,3% da renda do país, quase um terço do total.

No levantamento comparativo com outras nações, o Brasil só perdia para o Catar e estava atrás do Chile, o terceiro colocado, com 23,7% da renda total. Nem a populosa Índia, com todos os problemas religiosos e étnicos, tinha uma concentração de renda tão elevada.

Se ampliar a faixa de 1% para os 10% dos brasileiros mais ricos, a participação na renda do país sobe para 41,9% do total. Ou seja, os outros 90% da população conseguem menos do que 60% da renda total, só para evidenciar a tamanha disparidade.

Foto: Elza Fiúza/Agência Brasil

Eficiência  

Vários especialistas sugerem que o melhor caminho seria um programa que aproveitasse o Bolsa Família. A percepção geral é que se trata da política pública mais avaliada do governo federal, segundo Luis Paiva, que já foi secretário do PBF.

O embrião desse programa bem-sucedido, e com projeção internacional, foi o Bolsa-Escola, criado no Distrito Federal em 1995, quando o ex-senador Cristovam Buarque era o governador. O município de Campinas (SP) também adotou um programa semelhante.

Em abril de 2001, no governo Fernando Henrique Cardoso, a política ganharia abrangência nacional (Lei 10.219), também com o nome de Bolsa-Escola. Mais tarde, no primeiro governo Lula, foi renomeada como Bolsa Família (Lei 10.836, de 2004) e incorporou outros programas de transferência de renda, como o Bolsa Alimentação e o Auxílio-Gás. Nasce ao lado do projeto de Renda Básica de Cidadania do ex-senador Eduardo Suplicy (Lei 10.835, de 2004).

O PBF acabou sendo considerado por muitos especialistas, e pelo próprio Suplicy, como a primeira etapa do projeto do senador, que prevê uma renda básica para todos os brasileiros residentes no país e estrangeiros residentes há pelo menos há cinco anos no Brasil.

Paiva conta que o México lançou seu programa nacional em 2007, após visitar e conhecer a experiência do Brasil. Além dele, muitos países se inspiraram na iniciativa brasileira, como a populosa Indonésia, com 267,7 milhões de habitantes.

A Índia, continua o sociólogo, possui iniciativas localizadas, mas não tem um programa de transferência direta de renda na escala do PBF, que atende mais de 14 milhões de famílias. No Bolsa Família são beneficiadas as famílias pobres e na pobreza extrema, com renda mensal entre R$ 89,01 e R$ 178 por pessoa. Elas precisam estar inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal, com dados atualizados há menos de dois anos. O valor médio do benefício é de R$ 192 por família.

Outro aspecto relevante do PBF, segundo Paiva, é a sua eficiência na capacidade de ajudar a reduzir a pobreza, com custo inferior ao do outro grande programa de transferência direta de renda, o BPC, que paga um salário mínimo para cada beneficiário com deficiência.

Até o receio de ser uma política assistencialista que acabaria por acomodar os brasileiros pobres foi afastado. Paiva afirma que as avaliações mostraram que o “efeito preguiça”, um suposto desestímulo à procura por trabalho, não se confirmou nos vários estudos realizados. Isso pode ter sido um dos fatores que acabaram com as críticas e esvaziaram os discursos de políticos que se opunham ao programa.

O coordenador do Ipea é favorável a propostas que ampliem os recursos do PBF e os que garantem ajuda para as crianças, tenham foco nas famílias pobres ou sejam do tipo benefício universal, desde que repensadas as fontes de recursos. Poderiam, por exemplo, englobar as deduções com despesas escolares declaradas no Imposto de Renda.

Contudo, não bastam apenas transferências diretas de renda para socorrer os mais pobres. O país precisa, segundo Paiva, corrigir várias distorções para reduzir efetivamente a pobreza, como assegurar uma estrutura tributária progressiva. Hoje a carga tributária maior recai proporcionalmente sobre os mais pobres.

Fonte: Agência Senado

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